Around Venus - por Emiliano Mello

LIMITE



Pois é. Download terminado, voltei para participar a poucos que a partir de hoje passo a ostentar uma cópia de Limite, obra prima de Mário Peixoto. Filme não menos raro que o ar correrente na estratosfera. Filme que mudou a minha vida.



Foi na época em que me esforçava para realizar o sonho de me tornar aeronauta. Sem dinheiro para as aulas de piloto comercial, já que era necessário à formação alugar aeronaves para adquirir horas de vôo, contentei-me com a cabine de passageiros e me formei comissário de bordo, título inútil reconhecido inclusive pela Aeronáutica.

Enquanto ocupava meu tempo com "essa bobagem de virar aviador", namorava uma pequena que vivia afundada em variadas teorias políticas, estudando para concluir a faculdade de sociologia. Era um curso federal, o que exigia dedicação. Entretanto costumávamos nos encontrar regularmente à tarde, depois de meu curso. Certa feita combinamos de ir ao cinema - o convite partira dela: Limite, um filme mudo, em P&B e "com uma fotografia linda". Confesso, ruborizado, que ao ouvir os predicados do longa lamentei não poder ir para casa assistir à reprise de Stallone Cobra. Em todo caso, daria uns beijos na sala escura. Não seria de todo ruim o encontro. Fui.

Cinco pessoas no máximo "lotavam" a sala de exibição do Cine Arte UFF. No palco particular àquele cinema, sentado em um banquinho de madeira, exalando um cheiro adocicado de baseado queimado, um professor com cabelos de Moraes Moreira era o destaque. O mestre fazia gestos à Caetano Veloso. Falava mole e dizia nada feito Gil. Encarava a platéia com olhos de Ney Matogrosso. A voz pastosa dos que estão de pileque. Eu ri. Ela me beliscou, reprovando-me. Terminado o discurso, o mestre acendeu um cigarro amassado, estalou o dedo e o rapaz lá de cima ligou o projetor: Limite começou a rodar. E eu nunca mais fui o mesmo.